Como cães e gatos com sobrepeso ou obesos têm maiores chances de desenvolver uma série de doenças crônicas, a Medicina Veterinária entende que a expectativa de vidas desses animais é abalada. Na verdade, não só a expectativa, mas, também, a qualidade de vida no geral.
No livro “Obesidade em Animais de Companhia”, do médico-veterinário e editor Fabio Alves Teixeira e das coeditoras Mariana Yukari Hayasaki Porsani e Vivian Pedrinelli, as autoras mencionam que em um apanhado de estudos prospectivos realizados ao longo da vida de cães, foram acompanhados 48 labradores de oito semanas de idade, divididos em dois grupos pareados de acordo com sexo e peso corporal dentro de cada ninhada, na qual um animal recebia alimentação à vontade e seu par consumia 75% do que havia sido ingerido pelo outro animal. Foi observado que o tempo de vida médio dos cães que consumiram 25% menos que seus pares foi maior, em média, 1,8 ano a mais que os animais que consumiam à vontade.
Mariana e Vivian ainda destacam que em um estudo com felinos, foram analisados os prontuários de gatos que regularmente tinham seu escore de condição corporal (ECC) avaliado nos atendimentos. O ECC máximo de cada gato durante as visitas foi utilizado como variável primária de exposição, sendo realizadas duas análises de sobrevida para avaliar as associações do ECC com a expectativa de vida dos gatos. Foram incluídos nas análises 2.609 gatos e foi possível concluir que o ECC não ideal, seja ele de animais abaixo do peso (ECC < 3 em escala de 9 pontos) ou acima do peso com ECC 9, apresentou menor expectativa de vida.
“O excesso de peso foi associado à redução na expectativa de vida em cães de 12 raças. Os autores observaram que o excesso de peso levou à redução da sobrevida; no entanto, nesse estudo, esse fato foi mais evidente em cães de raças menores, e a expectativa foi menor em anos para esses em comparação a meses em cães de raça grande”, avaliam.
Um dos pontos apontados pelas veterinárias e que reduzem a expectativa de vida de cães e gatos são alterações da função renal. “Alguns estudos associam aumento de marcadores renais em pets acima do peso. A possível associação da perda de peso e os biomarcadores plasmáticos e renais de 37 cães obesos antes e após a perda de peso foram avaliados. Biomarcadores tradicionais para doenças renais, como ureia, creatinina sérica, exame de urina, relação proteína-creatinina urinária, albumina urinária corrigida pela creatinina; e marcadores específicos: homocisteína, cistatina C e clusterina. Os resultados sugeriram possíveis alterações subclínicas na função renal em cães obesos, que diminuíram com a perda de peso dos cães”, exibem.
Já em relação a gatos obesos, estudos apresentaram valores maiores de índice de resistência intrarrenal e dimetilarginina simétrica sérica (SDMA) em comparação aos felinos de ECC ideal. “Além da doença renal, estudos deixam claro que há relação entre obesidade e câncer, doença que claramente reduz a expectativa de vida de cães e gatos”, citam.
Qualidade de vida
Como apontado pelas profissionais no capítulo “Qualidade e expectativa de vida” do livro, animais obesos têm tendência a ter mais obstrução nas vias aéreas, ocasionando desconforto respiratório. “Isso porque o volume de fechamento pulmonar, onde as vias aéreas se fecham durante a expiração, é alcançado mais facilmente nesses animais e a capacidade de expansão dos pulmões é reduzida na obesidade. Esses animais podem ser acometidos por doenças como bronquite, colapso de traqueia, complacência e expansão pulmonar. Isso porque a sobreposição de tecido adiposo exerce pressão na musculatura da traqueia, agravando o colapso”, explicam.
A tosse é a manifestação mais comum dessas afecções, que podem ser referidas pelos tutores como ânsia de vômito e engasgos que levam a prejuízos, de acordo com as autoras. “Na qualidade de vida pela intolerância ao exercício, desconforto respiratório, taquipneia, cianose e síncope, que podem ser observados em casos graves. A melhora da função pulmonar e das manifestações clínicas pode ser alcançada em cães obesos com alterações respiratórias crônicas apenas com a perda de peso. Dessa forma, é fundamental que se realize perda de peso o mais rápido possível para melhora na tosse e desconforto respiratório”, aconselham.
Elas ainda elucidam que a obesidade também leva a alterações farmacocinéticas e dinâmicas, incluindo o metabolismo de anestésicos. “Cães obesos apresentam a oxigenação reduzida durante sedação profunda. O estado de oxigenação melhora com a perda de peso bem-sucedida, mas a ventilação não é influenciada pela obesidade. Essas diferenças fisiológicas entre os obesos e os pacientes com ECC ideal exigem ajustes de dose dependendo do anestésico; no entanto, são informações limitadas na medicina veterinária, sendo muitas vezes extrapoladas da medicina humana. Isso pode prejudicar a qualidade de vida, pois impossibilita procedimentos anestésicos necessários para o tratamento de diversas morbidades”, discorrem.
Ainda sobre cães obesos, as especialistas informam que eles apresentam alterações na estrutura e na função cardíaca, caracterizadas por aumento da largura do septo interventricular na diástole para a dimensão interna do ventrículo esquerdo na razão da diástole, diminuição das proporções entre pico inicial e pico tardio de velocidades de influxo do ventrículo esquerdo, proporções de pico inicial para pico tardio de velocidades do tecido anular mitral, aumento da fração de encurtamento e porcentagens de fração de ejeção. “No entanto, diferentemente de pacientes humanos, os cães obesos não foram considerados hipertensos”.
Já em cães de pequeno porte obesos, um aumento menor que 5 mmHg na pressão arterial (PA) foi observado por oscilometria, mas não por esfigmomanometria Doppler. “Dessa forma, existe a hipótese de que esse aumento pode estar relacionado a comorbidades. Em gatos, nenhum efeito da obesidade na PA foi observado por oscilometria, mas os gatos que estavam abaixo do peso tiveram PA ligeiramente mais baixa quando medida com Doppler do que aqueles que tinham peso corporal ideal ou obesos”, adicionam.
FAQ
Qual é o impacto da obesidade na expectativa de vida de cães e gatos?
A obesidade reduz significativamente a expectativa de vida de cães e gatos, como demonstrado em estudos que associaram o excesso de peso a alterações na função renal, doenças respiratórias e maior incidência de câncer.
Como a obesidade afeta a qualidade de vida dos animais de companhia?
Animais obesos enfrentam desconforto respiratório, intolerância ao exercício, e maior incidência de tosse e colapso traqueal devido ao acúmulo de tecido adiposo.
Quais são as principais complicações sistêmicas observadas em animais obesos?
Cães obesos apresentam alterações cardíacas estruturais e funcionais, como aumento da largura do septo interventricular e fração de ejeção elevada, além de possíveis alterações renais. Gatos obesos também demonstram resistência intrarrenal elevada e comprometimento na função renal, que podem ser minimizados com a perda de peso.
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