Cláudia Guimarães, da redação
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Em algumas situações, presenciamos debates sobre a saúde mental, mas, será que, de fato, todas as pessoas valorizam essa temática em suas vidas? Durante este mês, é realizada a campanha “Janeiro Branco”, uma iniciativa brasileira de conscientização e informação sobre a importância da saúde mental, criada por um psicólogo aqui do Brasil, chamado Leonardo Abrahão.
A cada ano, a campanha carrega um tema diferente e, segundo a psicóloga e professora especialista em saúde mental na Medicina Veterinária e presidente da Ekôa Vet, Bianca Stevanin Gresele, o maior objetivo da ação é incorporar a temática no nosso dia a dia. “Temos que entender que este é um tema pra todos, independente de classe social, idade, profissão e de qualquer coisa”, explana.
De acordo com a profissional, pelo fato de, no início do ano, as pessoas terem o hábito de criar metas e objetivos, pelo ano que está iniciando, é que a campanha ocorre em janeiro. “Uma das metas que aparece com muita frequência é que as pessoas querem se cuidar mais. E o branco também vem muito dessa ideia de representar esse início, como se fosse uma página em branco”, explica.
Como mencionado anteriormente por Bianca, a campanha traz temas diferentes a cada ano e, para 2023, é “A vida pede equilíbrio”. “Eu achei um tema muito pertinente, que está muito de acordo com tudo que está sendo falado nesses últimos anos. Porque é sobre a gente conseguir ter um equilíbrio maior entre a nossa vida pessoal e a nossa vida profissional. As pessoas estão nesse estilo de vida corrida, em busca de grande produtividade, com uma dificuldade de impor limites. Por conta disso, os indivíduos têm andado muito cansados, sobrecarregados”, observa.
Bianca lembra que, durante o ano de 2022, um dos temas que mais foi falado foi o Burnout. “Isso porque está sendo um reflexo de como as pessoas estão se sentindo na sociedade. Muitas pessoas entraram em Burnout porque estão desgastadas, trabalhando demais. A campanha deste ano está falando, justamente, em como a gente precisa restabelecer esse equilíbrio. Devemos ter mais relações saudáveis, buscar uma vida mais equilibrada em todos os campos, no campo da saúde física, da saúde mental, no campo social, no campo espiritual. E isso vale para todos, não só para profissionais da saúde, mas é um tema bastante pertinente para a área de Medicina Veterinária”, pontua.
Foco na Medicina Veterinária
Diante de sua experiência atuando com médicos-veterinários, que envolve o campo da prática, de pesquisa e acadêmico também, a psicóloga compartilha que percebe que, infelizmente, estes são profissionais que se encontram em um estado muito vulnerável. “Sempre tomar um cuidado pra não generalizar, mas, predominantemente, o que eu tenho acompanhado é que são profissionais que estão muito desgastados. Uma das grandes dificuldades é a de impor limites, de, justamente, equilibrar a vida profissional com a vida pessoal. É uma profissão que lida com muitas demandas emocionais, envolve a perda do paciente, envolve atender clientes e tutores que, geralmente, estão emocionalmente abalados. Por isso, é uma rotina cansativa, com plantões, realização de eutanásia, entre outras coisas, que podem ser consideradas fatores de estresse”, analisa.
A saúde mental fragilizada dos médicos-veterinários, segundo Bianca, pode ser considerada um problema de Saúde Pública: “Afinal, o veterinário é um profissional que atua em muitos campos, está dentro de uma profissão muito ampla. Infelizmente, no senso comum, geralmente, o veterinário é associado somente aos cuidados clínicos de pequenos animais. Precisamos, inclusive, começar a mudar essa imagem, a fim de as pessoas entenderem que esse profissional está à frente de muitas vertentes, de muitas áreas de atuação. Então, a saúde mental desse profissional é uma questão de Saúde Pública, justamente, porque o veterinário ocupa uma profissão central e essencial para a nossa sociedade”, destaca.
Além disso, essa é, também, uma questão de Saúde Pública porque, de acordo com Bianca, não pode ser uma preocupação somente dos próprios veterinários. “Esse autocuidado e essa melhoria na profissão é algo que eu acho que a gente pode tentar conscientizar mais os clientes e os tutores sobre e deles entenderem essas dificuldades que o médico-veterinário passa, assim como também eu enxergo que precisamos levar mais para a sociedade como um todo qual é a real rotina e qual é a real atuação dos veterinários. Porque essa profissão ainda é muito romantizada. Muitas pessoas descrevem a Medicina Veterinária como uma profissão linda, que cuida de bichinhos. É claro que tem uma parte muito bonita, mas sabemos que não é só isso, pelo contrário! Ela carrega muitos fatores de estresse”, ressalta.
A psicóloga cita que a sociedade precisa tomar cuidado, pois muitas pessoas têm o hábito de querer focar nos problemas depois que eles acontecem e tratar depois ao invés de tentar prevenir. “A campanha deste ano traz muito sobre a concepção de prevenção. E, dentro da Medicina Veterinária como um todo, tanto na parte dos alunos, na vida acadêmica, assim como para aqueles que já são profissionais”, pondera.
Para a prevenção de doenças e transtornos mentais, Bianca destaca dois pilares essenciais: “Precisamos preparar melhor os médicos-veterinários nas suas formações, inserindo disciplinas que tenham essa correlação com saúde mental, de processo de luto, comunicação de más notícias, rotina de autocuidados, realização de eutanásia e os aspectos psicológicos envolvidos nisso. Então, o primeiro pilar é o de preparo na base da educação e um segundo é na rotina do veterinário, onde, cada vez mais, podemos contribuir. Além disso, podemos, também, conscientizar esses profissionais sobre a importância do autocuidado. É muito comum o veterinário ficar muito focado em cuidar dos seus pacientes, dos clientes, por vezes, da equipe e vai se deixando de lado. Geralmente, são pessoas que têm uma rotina muito bagunçada, não dormem direito, não se alimentam direito, não praticam atividade física e, na maioria das vezes, não realizam terapia, nem têm momentos de socialização que são saudáveis, com pessoas diferentes e fora da profissão. Tudo isso pode impactar e trazer um agravo para a saúde mental desses profissionais”, indica.
A Ekôa Vet criou uma campanha chamada #VocêNãoEstáSozinho, que tem alcançado muitos profissionais da Medicina Veterinária. “Vocês, veterinários, não estão sozinhos. Busque ajuda de psicólogo e de psiquiatra, que são os profissionais que podem te ajudar nas demandas de saúde mental, assim como vocês podem buscar ajuda, também, de uma rede de apoio, tão fundamental em nossas vidas. Consideramos que rede de apoio é um fator, muitas vezes, de proteção, o que significa que ajuda a prevenir doenças mentais, assim como outros quadros”, declara.
Por fim, a profissional sugere que todos, especialmente aqui, veterinários que estejam lendo essa reportagem, que olhem para si: “Se permitam se cuidar, neste ano de 2023, se permitam se acolher e equilibrar mais as suas próprias vidas, mas vale lembrar que, na maioria das vezes, se não em todas elas, precisamos de ajuda para isso. Façam terapia e, realmente, levem essa bandeira de saúde mental para a vida de vocês”, finaliza.