Cláudia Guimarães, em casa
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Criada em 2014, por psicólogos brasileiros, a campanha Janeiro Branco propaga informações com um principal objetivo: desenvolver uma cultura sobre a importância da Saúde Mental na humanidade. Para isso, a campanha ocorre com o foco de deixar esse tema em evidência, gerar debates sobre as possibilidades de mudanças e aumentar a conscientização sobre a saúde mental e danos psicológicos.
A psicóloga, professora e presidente da Associação Brasileira em prol da Saúde Mental na Medicina Veterinária – Ekôa Vet, Bianca Gresele, explica que o mês de janeiro foi escolhido pelo seu simbolismo: “É o primeiro mês do ano, no qual, geralmente, as pessoas tendem a refletir sobre a sua vida e a desenvolver metas e objetivos para o ano. Diante disso, a campanha poderá inspirar os indivíduos a pensar, também, em sua saúde mental e inserir mais práticas de autocuidado em suas rotinas”, pondera.
A campanha é realizada pelo Instituto Janeiro Branco e profissionais de saúde mental, mas todas as pessoas podem aderi-la e colaborar compartilhando-a. Como destacado por Bianca, quanto mais pessoas tiverem acesso ao conteúdo, melhor. “Os psicólogos criadores da campanha realizam um tema diferente em cada ano, para abordar assuntos sobre saúde mental de diferentes perspectivas. Em 2022, a reflexão é a seguinte: ‘O mundo pede saúde mental. O que você faz para cuidar da sua saúde mental?’”, indica.
A partir disso, Bianca relata que, durante o Janeiro Branco, são promovidas palestras, eventos, debates, oficinas, workshops e rodas de conversa sobre a campanha e o tema, contribuindo para que tabus e paradigmas sejam quebrados e as pessoas orientadas a cuidarem da sua saúde mental.
Por conta dessa campanha e outras ações voltadas à saúde mental, o tema é cada vez mais debatido. “Felizmente, há um crescente reconhecimento da importância da saúde mental, mas, mesmo assim, esse assunto ainda é considerado um tabu, especialmente no Brasil, e é comum que as pessoas tenham muitas dúvidas a respeito”, observa.
Para Bianca, essas campanhas e debates contribuem para que seja possível desconstruir esse tabu e, a partir disso, construir um pensamento e uma cultura na qual preze pela saúde psicológica dos indivíduos, em todos os âmbitos. “Assim como para que as pessoas cresçam em um mundo que compreenda que cuidar da saúde mental é fundamental, pois impacta diretamente na qualidade de vida, no comportamento, emoções e relações de todos indivíduos. Além disso, a prevenção começa com o conhecimento e compreensão do que é a saúde mental e as doenças mentais e esses debates também auxiliam nessa maior conscientização”, avalia.
Saúde Mental na Veterinária
A psicóloga lembra que vários estudos já comprovaram que a exaustão emocional e doenças mentais são significativamente maiores entre profissionais da saúde, especialmente, para os médicos-veterinários. “O ambiente veterinário pode ser estressante e exigente, além de esses profissionais lidarem frequentemente com a morte, cuidados de fim de vida, eutanásia e limitações no local de trabalho. Pesquisas realizadas em outros países já comprovaram que os médicos-veterinários apresentam altas taxas de Burnout e fadiga por compaixão”, revela.
Diante disso, de acordo com Bianca, é vital que esses profissionais reconheçam de forma explicita os riscos para o seu bem-estar físico e mental e, a partir disso, busquem ajuda para si ou para ajudar um colega. “Tornou-se de suma importância promover abordagens e métodos de autocuidado para a saúde mental nessa área”, salienta.
Para cuidar da saúde mental, a presidente da Ekôa Vet afirma que é fundamental tomar consciência da importância à adoção de medidas preventivas que contribuam para o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, assim como, para a qualidade de vida como um todo. “Precisa-se perder o pudor de ter práticas de autocuidado, especialmente aqueles que cuidam, precisam ser cuidados e ter um ambiente saudável e protegido. Por isso, o autocuidado não deve ser visto como uma prática luxuosa, na verdade, deveria ser um requisito humano e ético na prática profissional”, argumenta.
Realizar psicoterapia, atividade física, atividades de lazer, qualidade de sono e alimentação, conviver com relações saudáveis e se desligar da vida profissional são exemplos de autocuidado citados pela profissional. “Além disso, é muito importante buscar ajuda de um psicólogo e/ou psiquiatra, quando necessário”, recomenda.
A psicóloga frisa que o bem-estar no dia a dia vai muito além do cuidado com o corpo, sendo necessário, também, pensar nos cuidados com a mente, com o psicológico. “O número de pessoas mentalmente esgotadas e com doenças mentais está crescendo e esses dados servem para nos lembrar em como cuidar da saúde mental é essencial. Diante disso, busque se cuidar, se colocando em primeiro lugar”, orienta.
Com relação ao luto, que muitos veterinários e tutores enfrentam pela perda de um animal, Bianca considera válido ressaltar que é um processo saudável e esperado diante de um rompimento de um vínculo importante. “As perdas fazem parte do ciclo vital humano e, quando alguém se depara com essa situação, é natural que o processo de luto seja vivenciado”, explica.
Bianca ainda adiciona que o luto é uma experiência que, embora apresente similaridade para os que passam, sempre será um processo subjetivo, ou seja, cada pessoa vivencia de forma diferente. “Além disso, o luto não é algo para ser superado, ele é um processo que precisa de tempo e não ocorre de forma linear. O mais importante é que o enlutado possa expressar a sua dor e seja acolhido”, pontua.
O que esperar de 2022?
Assim como o último ano, Bianca aponta que 2022 inicia com muitas incertezas, diante do quadro pandêmico que ainda estamos vivendo. “Isso impacta na saúde mental das pessoas e contribui para o aumento da ansiedade”, menciona.
A profissional acredita que a sociedade está passando por muitas transformações, dentre elas, a de perceber que essa correria do dia a dia não deve ser vista como benéfica e como sinônimo de conquistas. “Precisa-se prezar mais pela qualidade de vida, aprender a desacelerar, viver no aqui e agora, se permitindo. As pessoas precisam aprender a ‘não fazer nada’ e não se cobrarem o tempo todo por produtividade”, salienta.
Por fim, Bianca declara que a psicoterapia não é utilizada apenas para tratamentos, quando já existe um quadro, mas, também, pode – e deve – ser realizada como forma de autoconhecimento e prevenção.
Respondendo à questão central
Como já mencionado pela psicóloga Bianca Gresele, o tema deste ano da campanha Janeiro Branco é focado na seguinte questão: O que você faz para cuidar da sua saúde mental?
Por isso, fizemos essa pergunta a alguns médicos-veterinários, que deram as seguintes respostas:
“Para cuidar da minha saúde mental, faço terapia! Assim que me formei, comecei a fazer análise”
Médica-veterinária Leticia Steves dos Santos
“Minha vida foi tão corrida durante a pandemia. A casuística aumentou tanto e foram tantas aulas on-line, que faltou tempo para pensar em outras coisas. Mas acabei me dedicando mais à culinária por ser algo que gosto de fazer quando preciso me distrai. Além disso, aumentei minhas atividades físicas”.
Médico-veterinário oncologista Rodrigo Ubukata
“A parte principal de lidarmos com vida é que somos exigidos a todo tempo da entrega do melhor resultado, somos cobrados até por nós mesmos…e a grande diferença entre sofrer e viver bem, é cuidar da saúde mental. Eu reservo momentos para cuidar da espiritualidade, não esqueço da saúde do corpo: pratico atividades físicas, procuro ter momentos com a família e dedicar um tempo ao lazer”.
Médico-veterinário Vinícius Ribeiro
“Este é, realmente, um assunto muito delicado para mim! Prazer e sofrimento psíquico passaram a caminhar lado a lado na minha atuação, porque, mais do que dominar técnicas, representou um estado de ‘gatilhos de estresse emocional’ devido ao vínculo sensível com os animais. Para equilibrar a saúde mental, incluí esporte na minha rotina que me revitaliza mental e fisicamente. Também limitei minha imagem em rede social a uma das minhas atribuições, que é a área de pesquisa, evitando mostrar casos clínicos. Isso desestimulou o bombardeio de sinalizações de pedidos que recebia sobre animais doentes sem assistência nas situações de rua ou abandono. Além de não ser simples resolver, a sensação de impotência para mim e a de ‘não assistência’ para as pessoas que pedem, me levaram a um esgotamento que precisei gerenciar”.
Médica-veterinária Evelynne Marques de Melo