Cláudia Guimarães, em casa
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Quantas pessoas você conhece que têm apenas um gato? Agora, quantos conhecidos seus possuem dois ou mais gatos em casa? Sim, eles são irresistíveis e falo por experiência própria. A jornalista que vos fala tem cinco deles e, assim como você, leitor, irá aprender, nessa reportagem, que marca o Dia Internacional do Gato, como tornar essa rotina em companhia menos estressante para os felinos – e para os tutores.
Conversei com a médica-veterinária especializada em Medicina Felina e professora de Clínica Médica, da Universidade São Judas, Mariane Silva, que, inicialmente, comparou o tempo de contato dos cães e dos gatos com o homem: “Os gatos possuem 10 mil anos de convívio com o homem versus 100 mil anos de convívio dos cães conosco. Essa diferença significativa de tempo faz com que a evolução de ambas espécies com os humanos tenham impactos diferentes”, salienta.
Segundo ela, os cães, por exemplo, tiveram hábitos alterados ao longo do tempo. “Ao contrário, os gatos possuem os mesmos hábitos alimentares, comportamentais, sociais e territoriais que os animais que o originaram, o Felis silvestri lybica. Essa manutenção de comportamentos primitivos faz com que os gatos sejam vistos como animais que não gostam de seu tutor, que gostam apenas do ambiente. Os gatos têm alta capacidade de estudo de seu território, por isso, conseguem determinar rotas de fuga com facilidade. No entanto, eles são capazes de construírem fortes laços com seus humanos, a ponto de apresentarem problemas comportamentais e, até mesmo, físicos quando há ausência temporária ou definitiva de algum dos membros de sua família”, revela.
A médica-veterinária cofundadora da Vetso Clínica Veterinária Popular (Sorocaba-SP), Larissa Pereira Alves dos Santos, também destaca alguns pontos marcantes da personalidade dos gatos: “São independentes e pouco apegados, mas, o que poucos imaginam, é que são uma ótima companhia, porém, com uma característica e personalidade individual”.
Gatos e outras espécies
Larissa aponta que a relação com outras espécies varia muito com o comportamento de cada uma. “O gato é um animal territorialista, não gosta de se sentir ameaçado ou de barulhos que possam deixá-lo indefeso”, lembra.
De acordo com Mariane, os gatos, ao contrário do que os humanos acreditam, pertencem a uma espécie social com restrições, ou seja, são animais de caráter solitário, porém que podem tolerar a presença de outros seres. “Essa característica é semelhante a todas as espécies de felinos da natureza, exceto os leões que convivem em bando. A ideia da necessidade de companhia é uma humanização realizada por nós, uma vez que os seres humanos necessitam de relações sociais para se desenvolver e possuir qualidade de vida (característica essa que foi evidenciada durante a pandemia e a necessidade de isolamento). Para os felinos, todos os seres da casa fazem parte do seu ambiente, sejam eles humanos, cães ou outros gatos”, explica.
Mariane ainda menciona que os gatos dividem o seu território em ambientes para alimentação, “caça”, descanso e evacuação. “Ambientes nos quais existem muitos animais serão invadidos pelos companheiros de moradia. Tal ‘invasão’ predispõe a confrontos internos e distúrbios comportamentais”, alerta.
Assim, na visão da profissional, os tutores que possuem instrução veterinárias adequadas compreendem os motivos para possuírem um pequeno número de gatos ou, idealmente, um “filho único”. “Aqueles que desejam de ter mais de um animal, devem receber a instrução de como tê-los e como apresentá-los uns aos outros, a fim de ter baixo nível de estresse e alta qualidade de vida para ambos”, orienta.
A busca por gatos ao invés de cães apresenta ser uma tendência global, conforme destacado pela professora da Universidade São Judas, uma vez que os gatos ocupam pouco espaço (ideal nos casos de grandes cidades com alto índice de verticalização), demandam menos tempo para cuidados, são higiênicos, não requerem cuidados estéticos frequentes e demandam menos gastos. “Aliado ao fato do estilo de vida de seus tutores os manterem por períodos prolongados de trabalho, resultando em longos períodos longe de casa”, adiciona.
Gerenciando a convivência
Mariane declara que é importante que os espaços do gato sejam respeitados em casas com grande número desses pets. “Além do mais, é necessário que os recursos, como água, comida e caixas de areia, sejam distribuídos ao longo do território e não concentradas (como, habitualmente, acontece nos lares). Dessa forma, os gatos não precisam competir pelos recursos, evitando embates e problemas comportamentais, como agressividade entre animais e demarcações territoriais por arranhadura/micção inapropriada”, ensina.
Larissa também adiciona que os gatos são animais que gostam de ter seu próprio espaço, como mencionado: não gostam de dividir a mesma caixinha de areia, pote de ração e de água. “Principalmente, se for um animal novo em seu território. Contudo, não podemos dizer que eles gostam de conviver sozinhos”, argumenta.
Recursos que permitam com que o gato mantenha seu hábito natural de caça, como brinquedos interativos, também são importantes, segundo Mariane, para o bem-estar mental desses animais. “Os tutores também devem apostar em mobiliários que permitam que o comportamento natural de observação dos felinos seja respeitado. A colocação de prateleiras e nichos mimetiza as rotas de fuga presentes nos galhos de arvores e fornecem pontos de observação de seu território. Em ambiente com mais de um gato, tais rotas de fuga são essenciais para que os animais não precisem passar pelos mesmos locais, evitando embates e proporcionando acesso aos recursos em todas as partes do território”, destaca.
Mariane lembra que muitos tutores acreditam que seu animal é “bonzinho” e, por isso, aceitaria, tranquilamente, um companheiro; outros acreditam que seu gato é “ranzinza” e que nunca aceitaria outro gato. “Ambas afirmativas não são passíveis de serem 100% certeiras. Há diversos casos de gatos com bom temperamento que se tornam fortemente agressivos na presença de outro animal, enquanto há gatos completamente antissociais que tiveram melhora no seu comportamento com o advento de um novo gato. A não aceitação não é um problema, como muitos gostam de nomear, é apenas o gato seguindo seu comportamento natural”, desmistifica.
Larissa observa tutores dizendo que os gatos não gostam de viver sozinhos e, por isso, vão atrás de novos animais para preencher o ambiente. “Acredito que eles façam essa busca para não deixar o animal sozinho durante o tempo em que não podem estar presente ou, até mesmo, para tirar a solidão do companheiro”, analisa.
Mas, vale lembrar, que, independentemente da quantidade de animais em casa, o tutor tem que estar atento a todos os comportamentos do(s) pet(s), como salienta Larissa: “Tudo depende do animal, alguns não demonstram sinais evidentes de estresse, às vezes, são discretos, como na diminuição de ingestão de comida, água, pode ficar mais apático em um cantinho, podendo, até mesmo, ter alguns problemas relacionados a essas possíveis mudanças. Entre elas, podemos destacar a cistite idiopática felina ou, ainda, a cistite por estresse. Por isso, a importância de levar sempre os animais para consultas e check-ups de rotina na clínica”, reforça.
Larissa orienta os responsáveis legais pelos animais a tentarem fazer a terapia do reiki, cromoterapia, entre outras. “Acredita-se que o animal desenvolve um vínculo afetivo e uma confiança maior com seu tutor”, cita.
Para encerrar, como lembrado pela veterinária Mariane, um gato – seja adquirido da rua ou de gatil comercial – pode ter problemas de adaptação com os animais da casa e vice-versa. “A sua origem não determina o grau de problema de adaptação”, finaliza.