Por Felipe Machado, da Redação
A sensibilidade ao toque e à dor em cães foi o tema central da palestra do professor James Serpell, da Universidade da Pensilvânia, durante o III Simpósio Dor e Comportamento, realizado no último dia 28 de junho em formato online.
Utilizando dados do questionário CBARQ, ferramenta que reúne informações comportamentais de mais de 120 mil cães de companhia e assistência, Serpell destacou os fatores genéticos, ambientais e relacionais que podem aumentar a sensibilidade dos animais a estímulos dolorosos — um traço que tem implicações diretas para a saúde, o comportamento e a convivência com humanos.
Um dos principais achados do estudo é que cães pequenos, mais velhos e castrados apresentam maior sensibilidade ao toque. Raças como chihuahua, maltês e yorkshire terrier figuram entre as mais sensíveis, enquanto golden retrievers e bernese mountain dogs estão entre as menos reativas. “Animais sensíveis ao toque vivem em constante estado de ansiedade e medo, o que representa um sério problema de bem-estar“, alertou Serpell durante a apresentação. A pesquisa também relaciona essa sensibilidade aumentada ao risco de comportamentos defensivos, como mordidas — um problema de saúde pública que atinge milhões de pessoas todos os anos.
A origem do cão também se mostrou um fator determinante. Filhotes criados por seus próprios tutores ou adquiridos diretamente de criadores registraram os menores níveis de sensibilidade. Por outro lado, cães oriundos de abrigos, pet shops ou doações de amigos apresentaram índices mais altos.
Segundo o pesquisador, reabrigo precoce ou separação da mãe antes das sete semanas podem atuar como traumas, que aumentam a sensibilidade do animal à dor ao longo da vida. “É possível que a reabilitação ou o reabrigo precoce seja vivenciado como um trauma pelos filhotes”, explicou Serpell.

Outro aspecto analisado foi a experiência do tutor. Cães de tutores iniciantes tendem a ser mais sensíveis do que os de tutores experientes, e esse efeito é proporcional ao número de cães já criados anteriormente. A explicação pode estar na forma como os donos lidam com o filhote: ao tentar protegê-lo de situações desconfortáveis — como brincadeiras físicas intensas — eles podem, involuntariamente, impedir o desenvolvimento de uma tolerância natural ao desconforto cotidiano. “Esses dados mostram que criar cães é também uma questão de aprendizado humano”, destacou o pesquisador.
Além disso, o estudo apontou que cães mantidos exclusivamente como pets apresentaram maiores níveis de sensibilidade quando comparados a cães com funções específicas, como os de trabalho, reprodução ou exposição. A exposição precoce e frequente ao toque e ao manuseio parece atuar como uma forma de “dessensibilização”, preparando o animal para tolerar melhor situações de leve desconforto físico. Cães que vivem com outros cães também se mostraram menos sensíveis, possivelmente devido à interação física natural entre eles.
Os dados apresentados durante o simpósio reforçam a importância de práticas de socialização e manejo adequadas, especialmente nos primeiros meses de vida do cão. Castrações precoces, falta de experiências físicas e separações abruptas durante a fase de desenvolvimento podem ter consequências comportamentais duradouras.
FAQ
Por que alguns cães são mais sensíveis ao toque e à dor do que outros?
A sensibilidade ao toque em cães pode ser influenciada por fatores genéticos (como a raça), ambientais (como a origem e as experiências precoces) e relacionais (como a experiência do tutor). Raças pequenas, cães mais velhos e aqueles castrados precocemente tendem a ser mais sensíveis. Filhotes reabrigados muito cedo ou afastados da mãe antes das sete semanas também mostram maior sensibilidade, possivelmente por vivenciarem isso como um trauma.
A forma como o tutor cria o cão influencia na sensibilidade do animal?
Sim. Cães de tutores iniciantes costumam ser mais sensíveis do que os de tutores experientes. Isso ocorre, possivelmente, porque tutores de primeira viagem tendem a superproteger o animal, evitando expô-lo a situações físicas desconfortáveis — o que pode impedir o desenvolvimento de tolerância natural à dor leve. “Criar cães é também uma questão de aprendizado humano”, destacou o pesquisador James Serpell.
Como reduzir a sensibilidade ao toque em cães desde filhotes?
Práticas como socialização precoce, manipulação física frequente e exposição controlada a desconfortos leves (como escovação, cortes de unha e brincadeiras físicas) ajudam a dessensibilizar os filhotes. Evitar castrações muito precoces e garantir que o filhote fique tempo suficiente com a mãe e a ninhada também são medidas importantes para prevenir sensibilidades excessivas no futuro.
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