Doenças zoonóticas surgem pela degradação ambiental e exploração da vida selvagem
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e o Instituto Internacional de Pesquisa Pecuária (ILRI) publicaram um relatório que aponta dez recomendações para evitar o surgimento de novos surtos de doenças zoonóticas. Os autores identificam a Saúde Única, que une conhecimentos em saúde pública, veterinária e ambiental, como o melhor método para prevenir e responder aos surtos de doenças zoonóticas e pandemias.
As dez ações práticas que os governos podem tomar para evitar surtos futuros, segundo o relatório “Prevenir a Próxima Pandemia: Doenças Zoonóticas e Como Quebrar a Cadeia de Transmissão” são: investir em abordagens interdisciplinares, como a Saúde Única; Incentivar pesquisas científicas sobre doenças zoonóticas; Melhorar as análises de custo-benefício das intervenções para incluir o custo total dos impactos sociais gerados pelas doenças; Aumentar a sensibilização sobre as doenças zoonóticas; Fortalecer o monitoramento e a regulamentação de práticas associadas às doenças zoonóticas, inclusive de sistemas alimentares; Incentivar práticas de gestão sustentável da terra e desenvolver alternativas para garantir a segurança alimentar e meios de subsistência que não dependam da destruição dos habitats e da biodiversidade; Melhorar a biossegurança, identificando os principais vetores das doenças nos rebanhos e incentivando medidas comprovadas de manejo e controle de doenças zoonóticas; Apoiar o gerenciamento sustentável de paisagens terrestres e marinhas a fim de ampliar a coexistência sustentável entre agricultura e vida selvagem; Fortalecer a capacidade dos atores do setor de saúde em todos os países; Operacionalizar a abordagem da Saúde Única no planejamento, implementação e monitoramento do uso da terra e do desenvolvimento sustentável, entre outros campos.
O documento identifica que a tendência crescente de doenças zoonóticas é impulsionada pela degradação ambiental e pela exploração da vida selvagem. Ainda conclui que a África, em especial, por ter enfrentado várias epidemias zoonóticas, incluindo os recentes surtos de ebola, pode ser uma fonte de soluções importantes para conter futuros surtos.
Monitoramento de fauna. O médico-veterinário Ricardo Dias, professor do Laboratório de Epidemiologia e Bioestatística, da Faculdade de Medicina de Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP), alerta que a Ásia e a América Latina, especialmente o Brasil por conta da Amazônia e da Mata Atlântica, também são hotspots (áreas de grande biodiversidade) com potencial de doenças zoonóticas que poderiam se tornar pandêmicas. “Existem estudos anteriores à quarentena de covid-19 sobre a eminência do surgimento de doenças epidêmicas emergentes dessas regiões”, afirma.
Como no Brasil as fontes de financiamento de pesquisa são governamentais e, agora, devem sofrer cortes em função da dificuldade econômica do País frente à pandemia, para monitorar a fauna, Dias defende que os órgãos de fomento à pesquisa foquem em projetos abrangentes, direcionando um volume maior de recursos para grupos competentes. “Não são projetos triviais, envolvem grande logística, normalmente são locais sem infraestrutura e, por esse conjunto, acabam sendo caros”, explica.
Além disso, avalia que o monitoramento não seja feito exclusivamente em áreas conservadas, mas, também, na fauna urbana. “Alguns pesquisadores estão tentando fazer a eco vigilância de SARS-CoV-2 em animais na mata ou em áreas conservadas. O foco deveria ser invertido e voltado para áreas urbanas, totalmente negligenciada”, reforça.
Para a Saúde Única decolar do papel, o professor aposta em projetos multicêntricos, com pesquisadores de áreas distintas e políticas de financiamento, de ensino e de pesquisa, apesar de setorizadas, voltadas para um objetivo único. “Quem tem a chave para fazer essa integração são os gestores de cargos executivos dos órgãos de fomentos, das universidades e até da própria comunidade científica”, complementa.
Pesquisa. A revista Science também publicou um estudo que analisa as relações de custo-benefício da ausência de monitoramento e prevenção da disseminação de doenças zoonóticas, associada à perda e fragmentação das florestas tropicais e ao crescente do comércio de animais silvestres. De acordo com os pesquisadores, atualmente, investe-se relativamente pouco na prevenção do desmatamento e na regulamentação do comércio de animais silvestres, apesar dos planos que demonstram um alto retorno de seu investimento na limitação de zoonoses.
Para os estudiosos, à medida que o financiamento público em resposta à pandemia de Covid-19 continua aumentando, a análise sugere que os custos associados a esses esforços preventivos teriam sido substancialmente menores que os custos econômicos e de mortalidade envolvidos após o surgimento do patógeno. Leia o estudo completo aqui.
Fonte: CFMV, adaptado pela equipe Cães&Gatos VET FOOD.