A ampliação do conhecimento e constantes pesquisas, a nutrição hoje é mundialmente reconhecida na veterinária e sabe-se que é um fator essencial para aumentar a expectativa e qualidade de vida dos animais.
A importância do acompanhamento nutricional e controle de peso em felinos foi ressaltada na mais recente atualização das diretrizes de fase de vida de felinos da American Animal Hospital Association/American Association of Feline Practitioners, na qual em todas as etapas a nutrição é um ponto que deve ser abordado com o tutor (tabela 1).
Existem cinco nutrientes-chave, além da água, e cada um exerce função específica no organismo: proteína, carboidratos, gorduras, vitaminas e minerais. O requerimento desses nutrientes vai variar de acordo com a fase de vida e recomenda-se que os alimentos fornecidos aos animais estejam de acordo com as diretrizes da Association of American Feed Control Officials ou The European Pet Food Industry para evitar deficiência de qualquer nutriente essencial (tabela 2).
Gordura: as gorduras são fontes de ácidos graxos essenciais (AGE) que são necessários para determinados hormônios e manutenção das membranas celulares. Dentre os AGE, pode-se destacar o DHA e o ácido aracdônico (AA) em felinos filhotes, pois se acumulam seletivamente no cérebro e retina. Além disso, vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K) só podem ser absorvidas, estocadas e transportadas por meio da gordura. É o nutriente com maior densidade calórica, sendo ótima fonte de energia, fornecendo em torno de 2,5 vezes mais calorias que proteínas e carboidratos. Apesar de alimentos com maior energia metabolizável (4,0 kcal/g) sejam indicados para filhotes para colaborar para o ótimo crescimento, é preciso controlar a ingestão alimentar e prevenir o ganho de peso em excesso.
A necessidade energética é influenciada por inúmeros fatores, incluindo idade, escore de condição corporal, escore de massa muscular, status reprodutivo e nível de atividade física.
A castração pode ser um fator de risco para obesidade em felinos e a restrição calórica pode ser apropriada para prevenir o ganho de peso. Por isso, existem fórmulas diferenciadas para se estimar a necessidade diária energética em gatos adultos (tabela 1).
Já gatos idosos podem experienciar redução da capacidade digestiva, o que leva à diminuição do escore corporal e, tornando gatos abaixo do peso um problema comum.
Proteínas: proteínas são componentes formadores de órgãos, músculos, sangue, sistema imunológico, pelo e unhas, pois fornecem aminoácidos sulfurados e essenciais. Aminoácidos essenciais são aqueles que os gatos não conseguem sintetizar e devem estar presentes no alimento; mas, além disso, é de grande relevância que gatos consumam a quantidade adequada de proteínas que sejam facilmente digeridas e absorvidas. Durante a fase de crescimento, a demanda proteica do gato é maior do que em outras espécies, porém, essa necessidade reduz de acordo com que a taxa de crescimento vai diminuindo. O excesso de proteínas consumido pelo pet não é estocado no organismo, não sendo usado para construir tecido muscular como muitos pensam. Ofertar proteínas a mais do que a quantidade recomendada não traz benefícios adicionais ao gato.
Carboidratos: são usados como fonte de energia imediata, sendo utilizada em diversas funções corporais como metabolismo e função do cérebro e sistema nervoso. Não há descrito uma quantidade mínima necessária de carboidratos, mas esse nutriente é fonte concentrada de energia e de fibra dietética. Gatos são carnívoros estritos e são capazes de produzir glicose a partir de aminoácidos; contudo, conseguem utilizar carboidratos como fonte de energia, desde que bem processados. Mesmo o gato tem atividade moderada da amilase, quando comparada a outras espécies, felinos se adaptam a dietas com diferentes teores de carboidrato, incluindo amido.
Tem sido sugerido que dietas com alto carboidrato podem alterar o metabolismo energético e reduzir a sensibilidade à insulina, porém isso não é confirmado já que diversos estudos foram conduzidos para avaliar o impacto de carboidratos em biomarcadores de risco de diabetes mellitus e não foi encontrado associação clara entre ingestão de nutriente e essa doença. Importante ressaltar que a obesidade, resultante do balanço energético positivo, é sim associada à resistência insulínica.
Vitaminas e minerais: Diferentemente de cães, o excesso de cálcio em gatos não está associado com o desenvolvimento de doenças ortopédicas; contudo, a alta concentração do mineral pode reduzir de forma significativa a disponibilidade de magnésio. De modo oposto, a deficiência de cálcio associado com o excesso de fósforo ocorre na maioria das vezes em filhotes alimentados apenas com carne não suplementada. Essa combinação pode induzir o hiperparatireoidismo nutricional secundário que resulta em osteíte fibrosa e se manifesta por claudicação, dor e relutância em se mover. As quantidades necessárias de elementos traços são menores, o que engloba, ferro, cobre e selênio. Já as vitaminas são requeridas em quantidades muito pequenas. Gatos não conseguem produzir todas as vitaminas e estas devem ser suplementadas no alimento.
Assim, gatos possuem necessidades nutricionais específicas que podem variar de acordo com estágio de vida, saúde física e mental e nível de atividade física e o alimento deve, obrigatoriamente, fornecer o balanço correto de nutrientes. De forma complementar, o médico-veterinário deve fazer acompanhamento nutricional em todas as fases de vida do animal como forma de oferecer recomendações individualizadas e identificar qualquer alteração de forma precoce.
Referências
Nutritional Guidelines, FEDIAF 2020 <https://www.fediaf.org/images/FEDIAF_Nutritional_Guidelines_2020_20200917.pdf>
Fact Sheet Nutritional needs of dogs and cats, FEDIAF 2018 <https://www.fediaf.org/39-prepared-pet-foods/86-nutritional-needs-of-cats-and-dogs.html>
FEDIAF Scientific Advisory Board Carbohydrate Expert Review, 2019 <https://www.fediaf.org/images/FEDIAF_Carbohydrates-OnlineK.pdf>
2021 AAHA/AAFP Feline Life Stage Guidelines