Os animais braquicefálicos, como pugs, bulldogs, shih-tzu e persas, caíram no gosto dos brasileiros e estão cada vez mais comuns nas clínicas e hospitais veterinários. Além do focinho “achatado”, eles podem apresentar uma condição especificamente relacionada a essa característica, conhecida como síndrome braquicefálica.
Chamado tecnicamente de Síndrome Obstrutiva das Vias Aéreas Superiores dos Braquicefálicos (BOAS – Brachycephalic Obstrutivos Airway Syndrome), esse é um distúrbio respiratório multifatorial, que resulta de anomalias anatômicas congênitas associadas ao fenótipo braquicefálicos. Isso é o que explica a médica-veterinária e docente do curso de Medicina Veterinária do Centro Universário Max Planck (UniMax), Nathalia Villaça Xavier.
“Essas anomalias incluem compressão e redução do espaço aéreo funcional devido ao encurtamento do crânio, mesmo existindo um desenvolvimento de tecidos moles proporcional ao comprimento cefálico de raças dólico ou mesocefálicas”, afirma.
A profissional complementa que nesses animais também pode ocorrer estenose de narinas, alongamento de palato mole, hipoplasia traqueal, eversão de sáculos laríngeos e colapso laríngeo, que normalmente ocorrem em consequência do aumento da pressão inspiratória causada pela cronicidade da obstrução das vias aéreas superiores.

Lista de sinais clínicos é longa
Nathalia comenta que os principais sinais clínicos da síndrome braquicefálica são resultantes da obstrução mecânica do fluxo aéreo, da hipoventilação crônica e das alterações fisiopatológicas secundárias.
“As manifestações respiratórias incluem estridor inspiratório, respiração estertorosa em repouso, dispneia de esforço e intolerância ao exercício. Pode ocorrer ainda hipoxemia com episódios de cianose e síncopes induzidas por excitação, estresse térmico ou exercício”, cita.
Além disso, o que muitos profissionais não sabem é que essa condição também pode gerar sinais gastrointestinais. A docente explica sobre a Síndrome Gastrointestinal associada aos Braquicefálicos (BGIS), que é caracterizada por regurgitação crônica, vômitos recorrentes, sialorreia, disfagia e sinais compatíveis com esofagite por refluxo gastroesofágico.
“Em alguns casos ocorre hérnia de hiato e essas alterações são atribuídas ao aumento persistente da pressão negativa intratorácica durante os episódios de esforço respiratório”.
Complicações dermatológicas também são comuns e estão relacionadas a anatomia desses animais. De acordo com a médica-veterinária, as principais alterações na pele de pets braquicefálicos são dermatites de pregas, piodermites recidivantes e otites externas crônicas.
Adicionalmente a tudo isso, estudos recentes estão associando o fenótipo braquicefálico a ocorrência de alterações ortopédicas e neurológicas, como displasias articulares, especialmente coxofemoral e de cotovelo, e malformações vertebrais.
Diagnosticando a síndrome braquicefálica
A docente explica que para chegar a um diagnóstico assertivo da síndrome braquicefálica é preciso ter uma abordagem multidisciplinar e sistematizada.
“Inicialmente, realiza-se uma avaliação clínica detalhada, que inclui anamnese aprofundada e exame físico minucioso, com ênfase na ausculta pulmonar, análise do grau de estenose nasal (quando presente), sensibilidade dos seios nasais e verificação do padrão respiratório em repouso. Essa avaliação clínica é complementada pela aplicação de um escore classificatório padronizado, que estratifica a gravidade da síndrome conforme os achados clínicos”, explica.
Com relação a exames, os de imagem são os mais indicados. Dentre eles, está a endoscopia das vias aéreas. Xavier afirma que a endoscopia é recomendada para a inspeção direta e dinâmica das estruturas anatômicas envolvidas, permitindo a identificação de alterações como prolongamento do palato mole, estenose nasal, eversão dos sáculos laríngeos e colapso laríngeo ou de traqueia/bronquial.
Já as radiografias torácicas em projeções específicas são empregadas para avaliar a traqueia, os campos pulmonares e possíveis comorbidades associadas. “Contudo, devido às limitações da técnica radiográfica, como sobreposição de estruturas e dificuldade em avaliar dinamicamente as vias aéreas superiores, ela não é considerada padrão-ouro para diagnóstico da BOAS”, completa.

E o tratamento?
Não há saída, conforme cita Nathália, o tratamento da síndrome braquicefálica é predominantemente cirúrgico. Nele são utilizadas técnicas específicas para corrigir as anomalias anatômicas que causam a obstrução respiratória dos animais acometidos.
“Os procedimentos mais comuns incluem a rinoplastia para correção da estenose nasal, a estafilectomia para ressecção do excesso de palato mole prolongado e a correção da eversão dos sáculos laríngeos com a saculectomia, quando presentes”, cita.
Se houver colapso traqueal associado, a profissional esclarece que pode ser indicada a implantação de stents traqueais como um método minimamente invasivo para manter a permeabilidade da via aérea. “Essa técnica visa reduzir os episódios de colapso e melhorar a ventilação, especialmente em pacientes com comprometimento severo da traqueia”, afirma.
Além disso, também devem ser adotadas medidas ambientais para maximizar o conforto e a qualidade de vida do animal. “Dentre os cuidados ambientais podemos citar restrição à exposição ao calor e estresse térmico e controle rigoroso do peso corporal”, finaliza.
FAQ
A síndrome braquicefálica pode trazer prejuízos para a qualidade de vida do animal?
Como essa condição pode causar um comprometimento respiratório severo, isso leva a intolerância significativa ao exercício e redução da capacidade funcional para atividades rotineiras, como locomoção e comportamento exploratório.
Existe cura para a síndrome braquicefálica?
A síndrome braquicefálica está associada a conformações craniofaciais congênitas, que não podem ser revertidas de forma definitiva. Porém, as intervenções cirúrgicas corretivas são eficazes para reduzir a obstrução das vias aéreas superiores e promover uma melhora funcional respiratória, gerando alívio dos sinais clínicos.
Como prevenir a condição?
A prevenção da Síndrome Obstrutiva das Vias Aéreas Superiores dos Braquicefálicos se baseia na implementação de critérios genéticos rigorosos para seleção reprodutiva, visando reduzir a transmissão de características craniofaciais extremas.
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