Com criação, é possível repetir o procedimento várias vezes para todos os alunos poderem praticar, além de auxiliar na formação de médicos-veterinários mais éticos
Cláudia Guimarães, da redação
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As disciplinas de Técnica Cirúrgica fazem parte da grade curricular dos cursos de Medicina Veterinária das universidades brasileiras. No decorrer da disciplina, são passados conhecimentos teóricos referentes a seu conteúdo programático, mas, principalmente, habilidades e destreza aos alunos. Estes são os pontos mais importantes a serem desenvolvidos e fortalecidos pelos acadêmicos. Mas, além de cumprir um sistema educacional, essas horas/aula podem mudar o mundo, porque não? Transformar, quem sabe, uma técnica ‘viva’ que vinha sendo utilizada e, nela, dar lugar prático ao conceito de bem-estar animal. Foi o que fez Julia Maria Matera.
A médica-veterinária e professora titular do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP) começou a trabalhar, há 15 anos, com cadáveres preservados para o treinamento de futuros profissionais na área da cirurgia em sala de aula. “Na época, a prática ainda era incomum e pouco abordada”, relata.
Com a inciativa, Julia foi a vencedora de um concurso da World Animal Protection, que recebeu mais de 40 projetos, de diferentes Países da América Latina, sobre métodos substitutivos ao uso prejudicial de animais. Em seu projeto, ela descreve o ensino e treinamento de diferentes técnicas cirúrgicas e seus respectivos tempos – diérese, hemostasia e síntese – sem o uso de animais vivos. “Um dos tópicos que destaco é o uso de uma bomba que aumenta a pressão nos vasos do cadáver e ele sangra como um animal vivo”, enfatiza.
A profissional destaca ainda como principais objetivos do projeto o desenvolvimento de solução para a preservação de cadáveres, com o intuito de serem reutilizados; e o desenvolvimento de uma bomba artesanal, de função peristáltica.
Para Julia, a obtenção de cadáveres de forma ética tanto na Medicina Veterinária, bem como na medicina humana, vem se tornando um empecilho para o seu uso no ensino e treinamento. “Assim sendo, métodos de preservação para que o material possa ser reutilizado é de grande valia. Eram eutanasiados, na década de 90, anualmente, de 300 a 400 cães oriundos dos Centros de Controle de Zoonoses (CCZ), para se ministrar as aulas práticas de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental”, lembra e completa que, hoje em dia, os cadáveres para ensino são pacientes que têm óbito de forma natural, no hospital da instituição. “Os proprietários são consultados e assinam um termo de consentimento para, assim, doar o corpo para o ensino dos futuros profissionais”, completa.
Analisando o uso desta metodologia de ensino, durante o período de 2000 a 2015, segundo a especialista, é possível afirmar que os cadáveres quimicamente preservados mostraram-se adequados ao treinamento de diferentes técnicas cirúrgicas propostas em aula.
Quando questionada se é necessário o sacrifício de animais para ensinar e aprender a Técnica Cirúrgica, Julia responde que não. “94% dos alunos preferem o método atual ao utilizado há 15 anos. Com o método proposto há diminuição de estresse no ambiente de trabalho e confirmação de respeito à vida por parte do profissional que estamos formando”, destaca.