Cláudia Guimarães, em casa
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Após dois episódios recentes de morte de cães em voos nacionais, surge a importância de revisar as normas de transporte aéreo, bem como os tutores também estão mais alertas, já que esse tipo de locomoção com pets exige – e muito – cuidados e preparação. Prevenir é sempre melhor, mas caso haja algum problema, os tutores devem saber buscar seus direitos em relação às companhias aéreas.
De acordo com a advogada da saúde humana e animal, do escritório Nakano Advogados Associados, e presidente da Comissão Proteção e Defesa Animal, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP) subseção Santana, Claudia Nakano, uma preocupação comum às famílias que possuem pets é o que fazer com eles durante uma viagem de férias ou por outro motivo. “Primeiramente, é bom lembrar que algumas raças de cães são consideradas perigosas para viajar, como por exemplo, os cães branquicefálicos (com o focinho diminuído ou achatado), por sofrerem demais e terem risco de morte, pela dificuldade de respirar naturalmente”, menciona.
Além disso, um requisito imprescindível, citado pela advogada, para evitar problemas durante a viagem é a documentação sanitária do animal estar em dia, principalmente em voos internacionais e para que possa entrar em qualquer País do mundo. “Lembrando que cada País tem a sua lista de documentos que não se limita à Caderneta de Vacinação em dia ou atestado do médico-veterinário atualizado”, salienta.
Os principais problemas que o consumidor enfrenta são: cancelamentos e atrasos de voos, forma de transportar e demora na entrega do pet. “Quando o atraso ou cancelamento ocorrem, a companhia tem a obrigação de fornecer uma assistência material ao consumidor, que se estende ao animal, por exemplo, dar alimentação, hospedagem e transporte adequado”
Claudia lembra que, ao transportar um animal no compartimento de bagagem, a tripulação deve ter todos os cuidados para manter o local em boas condições de higiene, com temperatura e ventilação adequada ao pet. “A caixa de transporte também deve ser apropriada ao animal, permitindo que este possa deitar de lado e descansar durante o voo”, cita e ainda lembra que a demora excessiva na entrega do animal doméstico também pode ser um problema e ocasionar sequelas permanentes ou até a morte do animal.
A advogada orienta que, se o tutor tiver algum problema com a companhia aérea, poderá acionar os Juizados Especiais Cíveis, que estão localizados em aeroportos, com atendimentos gratuitos com questões que envolvam valores de até 20 salários mínimos ou acionar a Justiça com um advogado de sua confiança. “Hoje em dia, existe outra via de pacificação de conflito, que é a Conciliação por meio dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs) espalhados por todo o Brasil ou de Câmaras Privadas. “A conciliação é um meio de resolver o conflito de forma pacífica, sem ação judicial. É um procedimento mais barato, rápido, efetivo e, havendo acordo, este é homologado pelo juiz”, explica.
A profissional revela que muitos casos envolvendo pets tem sido resolvido por meio da conciliação, onde as partes são convidadas a participar de uma audiência e terão “vozes” para falar o que desejam, diferentemente de um processo judicial, que somente o advogado se comunica, muitas vezes. “Além de terem a possibilidade de conversar, podem resolver o conflito por meio de um acordo, se assim desejarem, para que seja finalizada a questão. Geralmente, nessas questões, são pedidos os danos materiais (o que o consumidor gastou com a viagem) e os danos morais (causados pelo sofrimento). O tutor poderá ser acompanhado por um advogado de sua confiança, para que possa ter um procedimento mais efetivo, e ser assessorado adequadamente”, descreve.
Importância dos animais
Claudia lembra que, em um passado recente, os animais domésticos eram considerados “coisas” ou “bens” pelo Código Civil. “Pelo conceito, as companhias aéreas continuam com o mesmo entendimento, não distinguindo uma mala de um animal. Devemos lembrar que o pet é um ser senciente, ou seja, tem a capacidade de sentir e são equiparados a sensibilidade dos homens, cada qual com suas diferenças, interesses e necessidades. As companhias aéreas devem estar mais preparadas para receber o público pet, oferecendo condições adequadas para a viagem, minimizando os riscos e respeitando a dignidade do animal”, defende.
Quando questionada sobre casos de danos ao pet, carregado de sofrimento emocional do tutor, devido ao vínculo com o animal, ela salienta que o transporte aéreo é um serviço prestado pelo transportador aéreo, que se obriga a transportar com segurança pessoas, animais ou coisas e essa relação está regulada pelo Código de Defesa do Consumidor, por ser caracterizada uma relação de consumo. “O animal doméstico é um considerado um membro da família. Atualmente, temos mais pets do que crianças em lares brasileiros. Assim, ao perder um animal de estimação por irresponsabilidade ou negligência de uma companhia, a dor é imensurável e o valor do dano será proporcional ao caso”, revela. Atualmente, de acordo com a advogada, existem jurisprudências, que são decisões reiteradas sobre o tema que responsabilizam companhias aéreas pelos danos suportados pelo tutor e animal.
Primeiras providências
A Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), por um órgão regulador, deve apurar os fatos ocorridos e investigar profundamente a companhia aérea, assim que notificada por um tutor de cão ou gato. “Caso o animal sofra ou venha a óbito por ocorrências inerentes à viagem, além do processo cível indenizatório, caberá uma denúncia na Delegacia de Polícia mais próxima e, no Estado de São Paulo, a ocorrência poderá ser feita por meio da Delegacia Eletrônica de Proteção Animal (DEPA), para averiguação de crime de maus-tratos. A lei n. 9.605/98 dispõe sanções penais e administrativas para crimes de maus-tratos a animais e, com a alteração da lei n. 14.064/20, as penas foram majoradas quando se tratar de cão e gato para reclusão de 2 a 5 anos, multa e proibição de guarda”, descreve.
Segundo Claudia, os órgãos de Defesa do Consumidor também podem ser acionados, mas, na prática, as ações cíveis indenizatórias, as denúncias na Delegacia de Polícia e as conciliações têm resolvido grande parte dos conflitos.
Claudia frisa que, ocorrendo algum problema com o animal antes, durante ou pós voo, poderá ser estabelecido um “quantum indenizatório” na ocorrência do dando moral, arbitrado conforme a extensão do dano, como ferimentos, sequelas ou até a morte do animal dentro da aeronave ou mesmo fora dela. “Assim que o animal é entregue à companhia, sendo transportado no setor de cargas da aeronave, esta adquire responsabilidade integral”, destaca.
Entretanto, para evitar problemas durante a viagem, Claudia diz que é importante apresentar a documentação sanitária do animal (que tem que estar em dia), uma caixa de transporte adequada (oferecendo conforto ao pet), oferecer pouca comida antes da viagem, ao desembarcar, ofertar comida e água ao pet (evitando a desidratação) e conferir se o compartimento de bagagem está com temperatura ideal e ventilação própria para o voo.
“No direito animal, temos uma ausência de leis que possam regular essas questões, mas temos que trabalhar com as normas existentes. Assim, o animal, por ser um indivíduo que tem capacidade de sentir emoções e dores, por exemplo, nos faz refletir uma mudança imediata em várias situações. Como membros de nossas famílias, devem ser respeitados e valorizados. Se acontecer qualquer situação de maus-tratos, é importante que haja a denúncia como forma de coibir tais práticas absurdas e inadmissíveis nos dias atuais”, finaliza.