A hipnose, técnica que utiliza relaxamento e sugestões verbais para induzir um estado de transe, já é tema de muitos debates. Agora imagine aplicar em animais de companhia! Essa foi a proposta de uma pesquisa conduzida pelo Centro Universitário do Distrito Federal (UDF), por meio do Programa de Iniciação Científica (PIBIC). O objetivo? Oferecer uma alternativa não invasiva para cães que sofrem com o estresse causado por ruídos intensos, como trovões e fogos de artifício.
O estudo foi liderado pela acadêmica do 9º semestre de Medicina Veterinária da instituição, Jardênia Marçal Rosa, e a escolha do tema surgiu do interesse em estudo do tratamento da dor, motivada pela disciplina de farmacologia e pela membrana com práticas integrativas. Após conversar com a professora Dra. Juliana Martins da Silva, surgiu a ideia de investigar uma hipnose não causada por medicamentos. “Tudo começou quando uma de minhas cadelas se assustou com fogos de artifício. Naquele momento, pensei: ‘será que a hipnose pode ajudar a reduzir o estresse em situações como essa?’”, conta Jardênia.
Com o apoio da Dra. Juliana, Jardênia passou a reunir materiais e realizou cursos sobre hipnose. Antes disso, contou, também, com a orientação da médica-veterinária patologista Dra. Letícia Batelli, que ajudou a definir os critérios de seleção dos cães participantes. “O principal objetivo foi a sensibilidade do cão a ruídos. Criamos estímulos sonoros simulando trovões e fogos de artifício, e apenas cães que apresentam alterações comportamentais severas, como ficar em estado de alerta, arfar, tentar fugir, chorar ou uivar, participariam”, explica Jardênia.
Métodos e aprovação ética
O estudo, aprovado pelo comitê de ética, seguiu rigorosos protocolos para garantir o bem-estar dos animais. Jardênia conta que, antes das sessões de hipnose, os cães passaram por uma anamnese e um tratamento piloto para verificar se estavam aptos a participar. Durante as sessões, foi utilizada uma escala de ansiedade adaptada do Dr. Aaron Beck para avaliar os resultados. “Comportamentos como arfar, uivar e tentar fugir foram coletados antes e depois das sessões, sendo anotados para comparação”, detalha Jardênia.
Além dos aspectos comportamentais, foram monitorados parâmetros fisiológicos como frequência cardíaca, frequência respiratória e temperatura corporal, utilizando termografia para registrar o grau de relaxamento dos cães de maneira rápida e eficaz.
Resultados
Foram realizadas cinco sessões de hipnose, conforme o cronograma do programa PIBIC. Jardênia relata que, em alguns casos, mudanças comportamentais positivas foram notadas já na segunda ou terceira sessão. “Alguns tutores disseram que seus cães estavam mais tranquilos em situações de ruído intenso. Contudo, houve um caso em que o animal precisou de mais sessões para apresentar resultados significativos”, observa.
Após o término das sessões em junho de 2024, Jardênia entrou em contato com os tutores em novembro, período de chuvas em Brasília (DF), para avaliar a permanência dos resultados. “Os relatos indicaram que os cães ficaram calmos durante tempestades, mesmo com trovões e raios. Isso demonstra uma eficácia prolongada da técnica”, avalia.
Conclusões e perspectivas
Com base nos resultados, na visão da acadêmica, a hipnose pode ser associada com outras técnicas, que muito embora não sejam tipicamente comportamentais, podem potencializar os resultados de melhora no comportamento dos cães, tais como aquelas utilizadas pela Medicina Integrativa. “Investigar o uso da hipnose para tratamento de cães que sofrem de estresse devido a ruídos sonoros, como trovões e fogos de artifício foi um desafio altamente inovador. Acredito que esse trabalho seja importante por abrir novas perspectivas, não só para o bem-estar animal, mas para a própria atuação do médico-veterinário que se interesse por esse viés”, declara Jardênia.
Para ela, essa alternativa pode significar a abertura de um campo de estudos e pesquisa, fazendo emergir novas alternativas para o tratamento não invasivo. “Por fim, pesquisar esse tema me acrescentou uma grande bagagem de conhecimento, não apenas comportamental, dos cães, mas do ponto de vista fisiológico também, além da possibilidade de atuação inovadora nos cuidados do paciente que apresenta estresse comportamental”, adiciona.
A orientadora, Letícia Batelli, acrescenta que a pesquisa sobre o uso da hipnose no tratamento de cães sensíveis a ruídos sonoros representa um marco de inovação na Medicina Veterinária. “Este trabalho não apenas amplia o escopo de abordagens terapêuticas disponíveis, mas, também, reforça a importância da aplicação da técnica por médicos veterinários devidamente habilitados. O conhecimento em comportamento animal, aliado à compreensão detalhada da Fisiologia Veterinária, é essencial para a modulação de comportamentos de forma ética, segura e eficaz”, considera.
A docente ainda frisa que o estudo não apenas demonstrou resultados promissores na redução do estresse causado por estímulos sonoros, mas, também, abriu novas perspectivas para o uso de terapias integrativas no bem-estar animal. “É um exemplo inspirador de como a ciência pode ser aplicada de maneira criativa e empática para melhorar a qualidade de vida dos animais e fortalecer a prática veterinária. Este projeto é, sem dúvida, um grande passo para o futuro da medicina comportamental e integrativa”, finaliza.
FAQ
Quais foram os critérios utilizados para selecionar os cães participantes da pesquisa?
Os cães foram selecionados com base em sua sensibilidade a ruídos, apresentando alterações comportamentais severas como arfar, uivar, tentar fugir, chorar ou ficar em estado de alerta diante de estímulos sonoros simulando trovões e fogos de artifício.
Como a eficácia da hipnose foi avaliada em cães durante o estudo?
A eficácia foi avaliada por meio de uma escala de ansiedade adaptada do Dr. Aaron Beck, além do monitoramento de parâmetros fisiológicos como frequência cardíaca, respiratória e temperatura corporal, utilizando termografia para medir o grau de relaxamento dos cães.
Quais são as perspectivas futuras para o uso da hipnose no tratamento de estresse em cães?
A hipnose pode ser associada a outras técnicas da Medicina Integrativa para potencializar os resultados, abrindo novas perspectivas no tratamento não invasivo de estresse em cães e ampliando o campo de atuação do médico-veterinário interessado em terapias inovadoras.
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