É comum ouvir de alguns tutores de gatos a frase “meu gato tem sintomas de autismo”, contudo será, mesmo, que o Transtorno do Espectro Autista (TEA) pode afetar os bichanos?
Sem muito suspense, a médica-veterinária Comportamentalista de Felinos, Debora Paulino, afirma se tratar de um mito, já que ainda não há materiais que comprovem cientificamente que existam gatos com o espectro austista.
Mas, então, quais comportamentos poderiam ser confundidos com características do TEA em humanos? Segundo Debora, os gatos, sendo uma espécie diferente da nossa, experienciam o mundo de uma forma distinta, o que, ao nosso olhar humano, pode ser similar às pessoas do espectro autista.
“Na verdade, os sentidos aguçados determinam comportamentos marcantes em nosso compreender, como, por exemplo, o fato de a espécie felina ouvir, ver e sentir por meio do olfato, nuances que nós não conseguimos compreender. Isso porque os gatos ouvem em uma faixa auditiva mais ampla do que a nossa, ou seja, sons ultrassônicos para nós. Por outro lado, eles enxergam com baixa luminosidade e em amplitude de até 200 graus e seu olfato ‘trabalha’ por duas vias pelos odores e por meio dos semioquímicos – feromônios”, explica.
Assim, os bichanos podem apresentar comportamentos estereotipados e compulsivos, o que pode ter similaridade com os traços do espectro autista. “Mas estes comportamentos, comumente, estão associados ao estresse crônico, se não de forma direta, indiretamente tem correlação”, informa.

Diagnóstico de transtornos neurológicos
Porém, como diferenciar um gato “diferente” em termos de comportamento de um gato que apresenta um transtornos neurológicos? Debora conta que, hoje, pela ciência, quando o tema é saúde do gato, há três aspectos envolvidos: físico (clínico), psicológico (comportamental) e ambiental.
“Um gato com um comportamento diferente pode ter questões físicas, emocionais e ou ambientais envolvidas. Este tripé da saúde influencia no gato como um todo. Um exemplo: um gato mora em uma casa multicat (+ 4 gatos) e, nesta residência, há disputa por uso de caixa de areia, potes de comida, este gato nunca vai estar completamente relaxado, ele vive em um ambiente estressor (estresse crônico) e, por esta questão ambiental ser desfavorável, este gato poderá ter manifestações na saúde física como, a síndrome de pandora. O tratamento deste gato vai envolver assistência à saúde física, mas, também, emocional, assim como ambiental”, discorre.
Segundo Debora, a identificação de condições neurológicas e comportamentais em gatos envolve desafios investigativos, de acordo com a especialista, especialmente porque o ambiente exerce influência significativa sobre muitos desses comportamentos.]
“Então, o médico-veterinário – clínico ou neurologista – se guia a partir de testes neurológicos e da anamnese (a parte investigativa), assim como é desejável desenvolver o trabalho em conjunto a um comportamentalista, para que o mesmo conduza com seus saberes, conhecimentos junto a anamnese”, recomenda.

Tutores, atenção!
Se um tutor perceber comportamentos peculiares em seu gato deve procurar orientação profissional, ou seja, um comportamentalista. “Num mundo ideal, todos os gatos deveriam, ao menos, uma vez passar em consulta com um comportamentalista para ter um ‘rx’ comportamental do gato. O que pode ser normal para nós ou até para outro gato pode não ser ideal para o seu gato, então, buscar orientação para investigar e diagnosticar se o comportamento peculiar é ou não um problema para aquele indivíduo é imprescindível”, orienta.
Para os gatos mais tímidos, algumas estratégias ou mudanças no ambiente podem ajudá-los a ter uma vida mais tranquila e feliz.
“O tutor precisa aumentar o nível de segurança emocional deste gato. Os felinos domésticos gostam e precisam de verticalização, de lugares seguros para dormir e de rotas de fuga. É possível verticalizar os ambientes – com propósito e planejamento – para que o gato possa ver o ambiente de cima, de modo que ele tenha a previsibilidade e amplitude visual do espaço. Locais seguros, aos quais o animal pode descansar, dormir e se entocar sozinho e tendo paz, acesso às caixas de areia, potes de comida e potes de água de forma uniforme pela casa toda. Estas são algumas das estratégias de enriquecimento ambiental para promover um ambiente que atenda às necessidades dos felinos da casa”, ensina.
Por fim, Debora reitera que, na literatura, ainda não há material comprovando o espectro autista nos gatos, mas, por outro lado, há inúmeras pesquisas que mostram a contribuição dos gatos na vida de pessoas com TEA. “Inclusive, a terapia assistida por animais, junto da terapia ocupacional, tem ganho cada vez mais espaço nos cuidados biopsicossociais de pessoas e principalmente crianças com TEA”, encerra.
FAQ
Gatos podem ter autismo?
Não há comprovação científica de que gatos possam ter Transtorno do Espectro Autista (TEA). Comportamentos que parecem “diferentes” normalmente estão ligados a estresse, ambiente desfavorável ou outros fatores naturais da espécie.
Como identificar se um comportamento “estranho” é um problema de saúde?
É preciso avaliar três aspectos: físico, emocional e ambiental. Muitos comportamentos incomuns estão ligados ao estresse crônico causado por disputas por espaço, recursos ou convivência com outros gatos. A avaliação conjunta de um clínico e um comportamentalista é essencial para diagnóstico correto.
O que fazer se meu gato apresenta comportamentos tímidos ou peculiares?
Buscar ajuda de um comportamentalista é o ideal. Além disso, enriquecer o ambiente com locais seguros, rotas de fuga, verticalização (prateleiras, arranhadores altos) e acesso adequado a comida e água pode ajudar o gato a se sentir mais seguro e tranquilo.
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