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No Dia da Mulher, veterinárias comentam escolha por carreira focada em pesquisa

Por Equipe Cães&Gatos
laboratório
Por Equipe Cães&Gatos

Cláudia Guimarães, da redação

claudia@ciasullieditores.com.br

Quais são os desafios e lutas diárias que as mulheres enfrentam perante à sociedade, na vida pessoal, profissional, em qualquer área? Neste Dia Internacional da Mulher – que deveria ser valorizada todo o ano -, focamos nas possíveis adversidades que mulheres médicas-veterinárias encaram quando resolvem trilhar o caminho da pesquisa científica.

A médica-veterinária mestra em Ciência Animal e pesquisadora doutoranda em Políticas Públicas, Evelynne Hildegard Marque de Melo, compartilha que se formou em Medicina Veterinária no ano de 2012, na Universidade Federal de Alagoas (UFAL). “Embora eu sempre estivesse atraída pelas espécies caninos, felinos e equinos, meu objetivo de carreira foi desenvolvido voltado aos caninos e felinos domésticos, onde, desde a graduação, mantive olhar sensível e atento às questões de impacto zoosanitário com estas espécies”, declara.

Ela conta que sempre gostou muito de ler e escrever: “Durante a graduação, sempre busquei me envolver com pesquisa e extensão universitária. Durante os cinco anos do curso, me mantive em estágio extracurricular e, durante os estágios, mantive o olhar atento aos casos raros, desafiadores e complexos que eu acompanhava, de modo que alguns tornaram-se relatos de casos publicados em eventos científicos ainda na graduação. Então, fui me descobrindo dividida entre a prática com clínica e cirurgia, mas, também, com pesquisas e publicações científicas. Ou seja, passaram a fazer parte de minha rotina estar entre lidar com a ‘mão na massa’, em contato com os animais (consultando e fazendo cirurgias), mas, também, com tabulação de dados, lendo e escrevendo artigos”, relembra.

A médica-veterinária, docente de Farmacologia aplicada a Medicina Veterinária, e Diretora do Hospital Veterinário da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), Déborah Mara Costa de Oliveira, também escolheu percorrer os caminhos da pesquisa e extensão. A profissional se formou em 2000 na UFRA, quando tinha o desejo de ser docente e trabalhar na prevenção e tratamento de doenças de cães e gatos. 

“Foi um processo natural ir para a área de pesquisa. Após concluir a residência, comecei minha carreira como docente e logo percebi a necessidade de ampliar o conhecimento e as habilidades para a área acadêmica, foi então que fui em busca do mestrado e doutorado e, durante essa formação, intensivamente você já incorpora a pesquisa”, afirma.

Áreas de atuação

O campo de pesquisa que Déborah mais aprecia é a Farmacologia Clínica Veterinária e ela explica que, não por acaso, esta foi a áre que escolheu para mergulhar no processo de ensino-aprendizado-ensino.

Já a área de pesquisa de Evelynne, hoje, é voltada a políticas públicas. “Ainda há poucos veterinários com interesse neste sentido e mulheres menos ainda. Acredito que isso possa aumentar a partir do recente reconhecimento, pelo CFMV, a especialidade Medicina Veterinária do Coletivo, pois, nesta área, o foco é manejo populacional de cães e gatos com atuações pontuais em Medicina de Abrigos, Medicina Legal e Medicina de Desastres, onde, inevitavelmente, passa pelo contexto político social”, analisa.

As questões que mais a incomodavam na época de estágios, foram as questões por onde Evelynne começou a se envolver profissionalmente. “O quanto isso agrega à minha vida profissional está totalmente relativo à minha realização pessoal e profissional, porque sou, naturalmente, inclinada a lidar com situações de desafios, com resolução de problemas relativos ao ambiente organizacional e social e que, coincidentemente, é onde há uma grande carência de veterinários”, observa.

Veterinárias acreditam que foi a própria sociedade que trouxe dificuldades às mulheres em todas as áreas profissionais (Foto; reprodução)

Pesquisas que marcaram

Déborah conta que gostou muito de ter trabalhando na linha de pesquisa de Etnofarmacologia Veterinária com Plantas Medicinais, sobretudo, porque está na Amazônia. Mas passou a vislumbrar o contato direto com a sociedade por meio da pesquisa e extensão. “Embora todas as ações tenham sua contribuição, seja em pesquisa básica ou avançada, aprecio muito o contato direto com a comunidade e procuro fazer deste contato um campo de absorção de conhecimento mútuo entre a universidade e a sociedade. O projeto que mais me orgulho de ter instituído, junto com meus orientados, todos estudantes de Medicina Veterinária, é a ‘Farmácia Veterinária Comunitária’, um banco de remédios veterinários que expande o saber e a solidariedade”, menciona.

Neste projeto, Déborah diz que os estudantes aprendem sobre os medicamentos que irão tratar ou prevenir doenças de cães e gatos, ao mesmo tempo em que realizam, mediante apresentação de prescrição veterinária, a entrega gratuita de medicamentos a tutores de cães e gatos que se encontram em situação de hipossuficiência econômica. “Além de conscientizar a sociedade sobre o uso responsável de medicamentos em animais, reduzir o desperdício, reduzir a geração de resíduos químicos para o meio ambiente, contribuir para a saúde e bem-estar animal e reduzir o abandono de animais por custo elevado de tratamentos farmacológicos. Ao mesmo tempo, o estudante envolvido, aprende sobre prescrição racional de medicamentos e coleta dados para pesquisa que costumamos publicar em periódicos”, descreve.

Para Evelynne, há duas pesquisas que a marcam até hoje. “A primeira é sobre hiperplasia fibroepitelial mamária felina, onde pude mergulhar em algo muito particular dos felinos e pelo significado que essa pesquisa trouxe, tanto para ajudar aos clínicos a compreenderem melhor o fenômeno da persistência do crescimento mamário nesta doença, mesmo após a castração que é o tratamento de eleição e eficaz, contudo é o que ‘assusta’ aos clínicos que, constantemente, se deparam com a estranheza de ‘castrei e parece que não foi o suficiente/não resolveu’. Isso tem levado muitos veterinários a submeterem as gatas à mastectomia. Minha pesquisa serve, justamente, para demonstrar que mastectomia é desnecessário e que esclarecemos o quanto tempo leva a cura da doença após a castração e, sobretudo, que o fenômeno da persistência no crescimento mamário após a castração é autolimitante, ou seja, assusta, porém, declina e a cadeia mamária acometida regride ao estado fisiológico”, explica.

A outra pesquisa que marcou sua vida profissional foi sobre as iniciativas de políticas públicas sobre cães e gatos no Estado de Alagoas. “Essa pesquisa, relativamente simples, trouxe uma clareza para o entendimento do ineficaz envolvimento político do Estado com o controle populacional destas espécies e notadamente com o distanciamento existente entre as classes técnica ‘médicos veterinários’ com a classe política ‘legisladores’. A partir dessa pesquisa, constatamos que Alagoas foi o último Estado da região Nordeste do País a instituir a política de castração, iniciada em 2017, pelo Governo Federal e que somente veio a ser abordada em meados de 2022 por aqui. Como contribuição, ficou o entendimento da importância do ambiente legislativo do Estado de Alagoas em caminhar lado a lado com a classe técnica veterinária, o que vem ocorrendo aos níveis municipal (na capital Maceió), estadual e federal, onde contribuímos com as proposições políticas mais alinhadas à realidade técnica”, detalha.

Mulheres à frente de pesquisas

Na ciência, de modo geral, Evelynne repara que a presença da mulher tem sido marcante, embora a inclinação profissional, aparentemente, seja maior para a área técnica de atuação ao nível de empresas, clínicas e pet shops. “Na área de políticas públicas, somos pouquíssimas. Inclusive, aqui em Alagoas, sou a única veterinária fazendo doutorado em políticas públicas. Participando de debates técnicos, observamos como ainda é muito mais ocupado por homens. O ambiente exige lidar com a complexidade de gestões públicas carentes de compressão técnica e há espaço para ser ocupado por nós mulheres”, relata.

Por sua vez, Déborah acredita que todas as médicas-veterinárias conseguem obter espaço onde quiserem: “Basta estarmos preparadas, focadas no objetivo, ter planos, se preparar, caso tenha que mudar de planos, e, quando a oportunidade chegar, estar pronta para agarrar”, aconselha.

Mas, ela também destaca o fato de ainda vivermos em uma sociedade machista: “Inclusive, no meio científico! E acabamos, por muitas vezes, tendo que nos esforçar muito mais para mostrar que, mesmo sendo mãe, dona de casa e dona de si, podemos, sim, ser pesquisadores, professoras, orientadoras e o que mais for necessário para conseguirmos nossos objetivos e sermos valorizadas pela nossa produtividade”, destaca.

Evelynne adiciona que foi a própria sociedade que trouxe essas dificuldades às mulheres em todas as áreas: “Desde a vida cotidiana, até o ambiente de pesquisa. Então, sempre consideramos que estamos vencendo barreiras, mesmo diante da igualitariedade conquistada em várias áreas. Ainda é forte, nas faculdades, os estudantes ‘segregados’, o conceito de que homens lidam com grandes animais e mulheres ficam com os pequenos animais. E a vivência vai mostrando que ambos podem ocupar muito bem os cenários de atuação, tanto homens em laboratórios, quanto mulheres sendo clínicas de bovinos e equinos. A mulher traz leveza ao ambiente de pesquisa e há muito espaço a ser ocupado”, argumenta.

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