A obesidade em cães e gatos inclui não apenas os fatores de risco para o desenvolvimento de outras doenças, mas, também, um grande impacto na qualidade de vida e no comportamento dos animais. As comorbidades associadas à obesidade podem estar intimamente ligadas às alterações metabólicas importantes.
No livro “Obesidade em Animais de Companhia”, do médico-veterinário e editor Fabio Alves Teixeira e das coeditoras Mariana Yukari Hayasaki Porsani e Vivian Pedrinelli, os médicos-veterinários Ticiane Giselle Bittencourt Freire e Aulus Cavalieri Carciofi abordam no capítulo “Paciente em estado grave e hospitalização”, que as modificações endócrinas dos animais nessa situação estejam intimamente relacionadas às mudanças imunológicas, oxidativas e inflamatórias que esses animais podem apresentar. “O excesso de tecido adiposo e seu crescimento desproporcional promovem infiltrações de células de defesa, que que, com as alterações estruturais, levam à produção desregulada de citocinas inflamatórias, resultando na desregulação das cascatas inflamatórias e modulação das células do sistema imune. Além disso, o estado inflamatório crônico de baixo grau pode interferir no eixo endócrino, modulando os níveis de leptina, diminuição da adiponectina e resistência insulínica, traduzindo-se em um perfil imunológico desequilibrado”, informam.
Nesse contexto de modulação do sistema imune, segundo os profissionais, os pacientes em estado crítico, inicialmente, apresentam liberações exacerbadas de citocinas inflamatórias e alterações endócrinas, resultando, também, em estado de hiperglicemia por causa da resistência à insulina (Troia et al., 2020). “Considera-se, assim, que as alterações imunológicas no paciente obeso em estado crítico, principalmente pela estimulação de células de defesa e aumento das proteínas de fase aguda e citocinas, resultem em aumento do gasto de energia e acelerado consumo das reservas de nutrientes, como gorduras e proteínas, por meio do catabolismo proteico. Logo, o equilíbrio energético torna-se mais complicado nesses pacientes. Além disso, a manutenção de euglicemia à beira leito torna-se tarefa mais difícil, dada a resistência à insulina presente no obeso”, explicam.
Alterações laboratoriais
No ambiente hospitalar, os veterinários mencionam que o estadiamento do paciente em estado crítico é de fundamental importância para definir a intensidade do tratamento, a utilização de vasoativos e a escolha de antibióticos, além de predizer o prognóstico e diferenciar sepse e choque séptico. “Para isso, os escores de pontuação SOFA (Sequential Organ Failure Assessment) e SIRS (Systemic Inflammatory Response Syndrome) são amplamente utilizados. Esses indicam a avaliação de diversos istemas, como o respiratório, o cardiovascular, o de coagulação e o neurológico, bem como as funções renal e hepática”, discorrem.
Apesar de não haver estudos robustos avaliando a interferência da obesidade e do estado metabólico alterado antes da admissão na unidade de terapia intensiva (UTI) na SOFA e na SIRS, os autores consideram prudente, ao avaliar o cão obeso em admissão da UTI, levar em consideração que pacientes obesos podem apresentar diminuição de leucócitos e linfócitos, aumento de fibrinogênio e maior pressão sanguínea quando comparados a animais com escore ideal, bem como alterações subclínicas renais, aumento da frequência respiratória e troca gasosa prejudicada.
Além das alterações metabólicas mencionadas, os animais obesos podem apresentar elevação na concentração sérica de triglicérides e colesterol. “Essa condição, combinada com a própria obesidade e outras alterações comumente encontradas na UTI, como hipotensão, estresse oxidativo e infecções, pode predispor a outra comorbidade comum na rotina: a pancreatite. Portanto, é crucial estar atento às manifestações clínicas, aos exames laboratoriais e de imagem e à necessidade de mensurar a imunorreatividade da lipase pancreática canina (cPLI)”, adicionam.
Outra comorbidade importante associada à obesidade, principalmente em felinos, e que é mencionada pelos veterinários, é a lipidose hepática, pois há maior prevalência dessa doença em gatos acima do escore ideal, principalmente quando associada à anorexia e ao estresse. “Dessa maneira, a atenção deve ser redobrada para a alimentação de gatos obesos em ambiente hospitalar, tanto com a identificação da alteração logo no início como com a presença da lipidose já estabelecida. Por se tratar de doença que possui alterações clínicas inespecíficas e pode se assemelhar com outras doenças hepáticas em felinos, como a colângio-hepatite, deve-se atentar a aumentos na atividade sérica da fosfatase alcalina (FA) e pouca ou nenhuma elevação de gama-glutamiltransferase (GGT), que é característica dessa enfermidade. Deve-se, ainda, associar esses dados com a história do animal, principalmente de perda de peso recente e anorexia prolongada, bem como com exames de função hepática e de imagem”.
FAQ
Quais os principais impactos da obesidade em cães e gatos no contexto hospitalar?
A obesidade em animais de companhia está associada a alterações imunológicas, inflamatórias e metabólicas, que complicam o equilíbrio energético, aumentam o risco de hiperglicemia devido à resistência à insulina e interferem no manejo de pacientes em estado crítico.
Quais parâmetros laboratoriais devem ser considerados ao avaliar animais obesos em estado crítico?
Os animais obesos podem apresentar diminuição de leucócitos e linfócitos, aumento de fibrinogênio, alterações subclínicas renais, pressão arterial elevada e troca gasosa prejudicada.
Por que gatos obesos são mais propensos a desenvolver lipidose hepática em ambiente hospitalar?
Gatos obesos têm maior risco de lipidose hepática, especialmente quando associada à anorexia e ao estresse. A doença é caracterizada por alterações clínicas inespecíficas, como aumento da atividade da fosfatase alcalina (FA) e pouca ou nenhuma elevação de gama-glutamiltransferase (GGT), requerendo atenção a histórico de perda de peso recente e exames específicos para diagnóstico e manejo.
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